No que se refere ao debate sobre a vacinação obrigatória contra Covid-19 em crianças (de idade entre 5 a 11 anos, conforme aprovado pela Anvisa), o Art.14, §1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) determina como ‘’obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias’’.
Em contrapartida, alguns juristas ainda entendem haver certa lacuna jurídica nesta discussão, devido a uma ausência de uma definição na norma: ‘’Quem seria a autoridade sanitária a qual o ECA menciona?’’
Neste contexto, há defensores tanto da suficiência apenas do aval da Anvisa para que a norma seja aplicada, quanto os que afirmam acerca da necessidade da inclusão da vacina infantil no Plano Nacional de Imunizações (PNI) e no calendário vacinal nacional, pelo Ministério da Saúde. O rol de obrigatoriedade vacinal do PNI para crianças e adolescentes, por exemplo, é bastante limitado, ou seja, conforme sua política, nem todas as vacinas disponíveis no mercado seriam obrigatórias para esta população. Portanto, atitudes e políticas divergentes entre os institutos sanitários nacionais relativiza consideravelmente o debate.
No contexto do rol de vacinas obrigatórias do PNI, este também possui amparo legal do ECA, em seu Art. 249, o qual expõe o seguinte: Caso os pais se recusem a aplicar qualquer das vacinas obrigatórias listadas, estarão sujeitos a uma sanção pecuniária, ou seja, multa, cujo valor pode variar entre 3 a 20 salários mínimos. Isso se deve pelo motivo de que, aos pais ou responsáveis pelo menor recusarem a aplicação de vacina obrigatória, estes estarão descumprindo com seu dever legal de tutela. Ademais, em casos de reincidência, o valor da multa será cobrado em dobro, podendo chegar a até perda de guarda, porém esta última sanção sendo mais rara.
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, realizou um parecer sobre a constitucionalidade da obrigatoriedade da imunização, em uma ação judicial em que foi relator, referente ao tema debatido: ‘’(…) não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar’’. O ministro ainda completa que os casos constitucionais são aqueles nos quais a vacina, já registrada pelo órgão fiscalizador sanitário:
‘’ 1) Tenha sido incluída no PNI; ou
2) Tenha sua aplicação obrigatória determinada em Lei; ou
3) Seja objeto de determinação da União, Estado, Distrito Federal ou Município, com base em consenso médico-científico. ‘’
Portanto, diante do presente debate, para que tenhamos uma definição clara a respeito da obrigatoriedade da vacinação em crianças, faltará determinar se a mencionada norma do ECA já se torna válida a partir da recomendação da Anvisa, ou se será preciso aguardar um posicionamento do Ministério da Saúde a respeito.
Dr. José Q. Salamone, advogado especialista em Direito Médico.
Gabriel Salamone, assistente jurídico.